Página virada

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Coluna publicada no dia 07/10.

Pra começar essa conversa, é importante dizer que o assunto da desapropriação do prédio da Ingool, que movimentou Canela nas últimas semanas — é, de certa forma, página virada. Chegou-se, enfim, na melhor decisão possível pra este momento. E isso precisa ser reconhecido.

Foi uma daquelas histórias que começaram com surpresa, cresceram como uma onda e terminaram com um certo alívio. A Prefeitura anunciou lá atrás, no dia 16 de setembro, a intenção de desapropriar o prédio da escola. Menos de dez dias depois, em 26 de setembro, os proprietários da Ingool notificaram oficialmente a Associação Educacional Cidade das Flores, que é mantenedora da escola Ingo Lied sobre a desapropriação. A notificação destacava a informação de que proposta de R$ 10 milhões da Prefeitura foi aceita de plano, ou seja, não iria para meios judiciais, e a desapropriação seria resolvida de forma amigável.

Tudo indicava que o negócio seguiria adiante com tranquilidade, sem disputa, sem demora. Mas aí veio a parte mais delicada da história: todos pegos de surpresa a partir dessa notificação: os pais, os professores, a associação, nem sequer o presidente da Câmara de Vereadores, Felipe Caputo, que é pai de aluno da escola, sabia do possível desfecho.

Foi nesse ponto que a coisa saiu dos trilhos. A pergunta que ficou no ar foi: o que vai acontecer com a Ingo Lied.

“Eu, enquanto pai, não sabia o que estava acontecendo”

Durante a sessão da Câmara, Caputo falou sobre o caso com a sinceridade que costuma ter, mas com aquele desconforto claro de quem foi pego de surpresa. A fala dele retrata muito bem o que aconteceu:

“Sobre a Ingool, também, tem que fazer minha crítica. Eu, enquanto pai, meu filho estuda na escola, e eu não sabia o que estava acontecendo. Só que eu falei, não vou passar por cima da secretária e nem do prefeito, eu vou esperar. Até então, as notícias que eu tinha, geralmente, são realmente as matérias que estavam sendo publicadas. Mas eu fiquei sabendo hoje, também, que não vai ter mais a compra”, Felipe Caputo, presidente da Câmara.

E é exatamente isso: o que Caputo disse traduz o sentimento geral de quem estava do lado de fora da conversa. Um assunto grande, de interesse público, foi tratado de forma muito interna, quase sem ventilação. E é aí que entra a palavra que faltou desde o começo: diálogo.

“De cima pra baixo”

Na mesma sessão, o vereador Cabo Antônio também se manifestou sobre o caso, mas com um tom bem mais forte. Ele criticou a forma como a Prefeitura tratou o assunto, dizendo que foi uma decisão tomada “de cima pra baixo”, sem a participação da comunidade escolar.

O vereador citou que essa seria a terceira vez que o governo teria imposto decisões à população — mencionando episódios envolvendo o esporte e o festival de teatro — e afirmou que o caso da Ingool “feria a democracia” por não ouvir pais, professores e direção da escola. Ele ainda fez uma comparação direta ao dizer que, no passado, se criticava a falta de diálogo em outras gestões, e que agora, segundo ele, estaria acontecendo algo semelhante.

A fala foi dura, com ênfase na ideia de que a comunidade deveria sempre ser consultada quando o tema envolve a vida escolar.

Linha do tempo

Tudo começou com um decreto publicado no dia 16 de setembro, declarando de utilidade pública o imóvel da lngool para fins de desapropriação. A justificativa da Prefeitura era construir uma escola nova no centro da cidade, algo que não acontece há 25 anos.

A proposta era boa, nobre até. Quem é contra construir escola? Mas o que faltou foi o básico: conversa. A notícia caiu como um raio. Os pais souberam pelas matérias publicadas, como bem disse o próprio Caputo. Os professores, da mesma forma. E, enquanto isso, os donos da Ingool já tinham aceitado a proposta.

Tudo ia mudar — e ninguém sequer sabia.

Quando a comunidade se levanta

Foi então que Canela viu uma das reações mais fortes dos últimos tempos. A comunidade da escolar da Ingo Lied se organizou, se manifestou, foi as redes, falou com vereadores, pressionou a Prefeitura. E, pela primeira vez neste governo, a sociedade se insurgiu de forma coletiva contra uma decisão.

Muita gente lembrou de outros episódios recentes — como o cancelamento da Feira do Livro, que também gerou uma onda de descontentamento. Mas o caso da Ingool foi maior, mais simbólico. Porque envolvia crianças, famílias, professores, e uma escola que carrega anos de história e afeto.

A revogação e o diálogo

Na segunda-feira, ontem, veio o desfecho: o decreto de desapropriação vai ser revogado. A Prefeitura voltou atrás. E, dessa vez, houve conversa.

O prefeito Gilberto Cezar se reuniu com os pais, ouviu as angústias, explicou as intenções, e — talvez o mais importante — deu o braço a torcer. Mostrou que está disposto a dialogar.

E isso, sinceramente, foi o melhor desfecho possível.

Porque o problema nunca foi querer fazer uma nova escola. O problema foi a forma como isso foi comunicado. Como se o gesto mais simples — o de chamar pra conversar — tivesse sido esquecido no caminho.

O que fica

O que fica dessa história toda é uma lição. Porque, no fundo, ninguém aqui está pra errar.

Como o Claudio Scherer lembrou hoje, durante o programa Chimarrão e Atualidades, a gente entrevistou o prefeito Gilberto lá atrás, quando ele ainda era candidato. Ele falava com brilho nos olhos, com aquele entusiasmo de quem sonha com uma cidade melhor. E esse brilho ainda está ali.

Ninguém entra num gabinete pra errar. Ninguém acorda de manhã querendo comprar briga com pai de aluno. Às vezes, a boa intenção tropeça na pressa, ou se perde na burocracia, ou é mal comunicada.

Mas ontem, o prefeito acertou. Porque conversar é sempre o primeiro acerto.

O lado humano das decisões

Toda essa confusão serviu pra lembrar que cidade se constrói junto. E que o diálogo — essa palavrinha tão simples — é o que sustenta qualquer relação entre governo e comunidade.

A desapropriação da Ingool, se tivesse seguido adiante, não seria ilegal, nem absurda. Era, na verdade, uma proposta legítima. A escola poderia, futuramente, abrigar algo importante. Mas quando a decisão envolve crianças, famílias, e uma comunidade inteira, não poderia ser da forma que estava se desenhando.

Tem que chamar, tem que ouvir, tem que deixar claro. É o mínimo.

Entre erros e acertos

É curioso ver como Canela vem amadurecendo como cidade nesse aspecto. O que aconteceu com a Ingool mostra que as pessoas estão atentas, participativas, e não têm mais medo de se manifestar. Isso é democrático, é bonito de ver.

E mostra também que o governo está disposto a ouvir. Porque, convenhamos, voltar atrás não é fraqueza. É grandeza.

O decreto vai ser revogado, a comunidade foi ouvida, e todo mundo saiu com uma lição na bagagem.

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