REGIÃO – A perda de um filho é dolorosa, irreparável, não cicatriza. Independente da idade e da quantidade que os pais têm, faz e sempre fará falta. Mas os comentários no entorno, na tentativa de confortar incomoda e em muitos casos machucam.
Uma Organização Não Governamental (ONG) denominada de Amada Helena, foi criada em 2013, apoiando e informando pessoas impactadas pela perda de um filho, por meio de projetos sociais, psicológicos e buscando melhorar o cuidado a esses pais.
A entidade com sede em Gravataí, chama-se Helena. A menina nasceu com problema cardíaco e morreu com apenas 17 dias de vida, lutando por uma vaga na UTI Neonatal. Os pais Tatiana e Giovane Maffini, sentindo falta de um acolhimento, criaram a ONG que já ofereceu suporte para mais de 30 mil pais no Rio Grande do Sul.
Moradores de Canela, o casal Paulo Moraes, 53 anos e Eluise Araújo, 34, participam da ONG e são ativos nas ações realizadas na região metropolitana. O casal tem 11 filhos, sendo três do atual relacionamento. O mais recente é Antônio Gael de seis meses. Mas a vida de ambos mudou de forma drástica em 2021, e a partir deste ano o ingresso na Associação Amada Helena.
Eluise que trabalha como doula (profissional que atua na assistência às mulheres durante toda a gestação até o momento do pós-parto), estava grávida de Antônio Francisco a 13 semanas, quando a criança perdeu a vida. Ela conta que no dia, tinha um exame, em Caxias do Sul. No trajeto, por telefone estava auxiliando uma mãe, residente em Canela, em trabalho de parto e ao chegar no consultório, foi constatado pela médica que o bebê que estava dentro do útero não tinha mais vida.
“Tinha agendado este exame que era difícil conseguir. Fui fazendo acompanhamento do parto de uma mãe por telefone. Aí recebi a notícia que meu filho não tinha mais vida. Retornamos e fui auxiliar neste parto, chorei na frente da casa da gestante. Ajudei no trabalho de parto e fomos para o hospital. Mesmo na dor cuidei de uma mãe. Depois em casa entrei em trabalho de parto. Uma das minhas filhas me ajudou, estávamos no chuveiro ela que aparou o Antônio Francisco, na palma da mão [cerca de 3 centímetros]. No nosso caso ficamos com o feto, avisamos o médico o que tinha acontecido”, descreveu.

A legislação atual, caso o trabalho de parto com a criança sem vida nasce com menos de 500 gramas ou 22 semanas, não é realizado registro de certidão de nascimento e óbito. Este caso aconteceu com o casal. Em 2022, ela estava grávida de Maria Helena, a gestação teve 9 semanas, o parto foi realizado no hospital e abortou. “Minha filha se tornou um lixo hospitalar, antes disso infelizmente pela legislação não é considerado pessoa”, disse.
Já Antônio Francisco, o caso foi diferente. O casal ficou com ele pelo fato do parto ter ocorrido em casa. O pequeno, cabe na palma da mão e foi enterrado em uma caixinha que fica na sala da casa da família com flores e um quadro no entorno com seu nome e do filho mais novo de Paulo e Eluise.
Dor e o apoio
Paulo Moraes mencionou que não importa quantos filhos tem, se já nasce sem vida, a dor da perda é e mesma, pois se cria expectativas com as crianças que ainda vai nascer.
“Era uma vida que precisa ser respeitada, foi um período curto, mas foram semanas incríveis é nosso filho! Tu projetas imagens, sentimentos de como seria se ela [criança] estivesse aqui. Tanto pai quanto a mãe e não pode fingir que não existiu, mesmo que não tenha nascido com vida”, disse.
Eluise é concomitante ao que disse o esposo e lembrou das frases que recebeu quando da perda dos filhos, que mesmo que sejam para confortar acabam em muitos momentos aumentando a dor e o sofrimento.
“Nós vamos vivenciando esta expectativa do nascimento e isso acaba dilacerando o coração. E a sociedade não valida esta dor, não sabe o que dizer. Muitas pessoas chegam para nós dizem está em um lugar melhor é uma estrelinha no céu, mas quando o céu não tem estrelas?”, indagou.
Mas o que falar neste momento? Uma campanha idealizada pela ONG Amada Helena sobre a campanha de conscientização sobre Luto Parental deste ano, está sendo denominada de “Eu Não sei o que Dizer”. Inclusive pais integrantes da associação fizeram uma sessão de fotos, em Canela, segurando cartaz com frases que eles receberam, após a perda de um filho. Os cliques foram realizados pela fotógrafa canelense Daniela Battastini.
Paulo revela que a intenção dele e da esposa Eluise é de criar um núcleo da associação em Canela para auxiliar pais canelenses e gramadenses e buscam apoio dos setores públicos e privados.
“Os pais da comunidade de Canela e Gramado podem nos procurar. A ONG acolhe, não importa a idade do filho e o motivo. O objetivo é acolher a dor da família com rodas de conversa, queríamos este apoio aqui. ONG é totalmente gratuita, temos a parceria da Defensoria Pública e Assembleia Legislativa. Vamos buscar fazer ações aqui na região também”, finalizou.
Saiba mais
Julho é o mês de conscientização da causa do Luto Parental. A ação faz parte também da Semana Gaúcha e estimula a reflexão acerca da Lei Helena Maffini, instituída no ano passado, que estabelece procedimentos a serem adotados nos casos de perda gestacional, natimorto e perda neonatal nos serviços públicos e privados de saúde contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), bem como busca conscientizar e orientar os profissionais de saúde e a sociedade sobre a importância e a sensibilidade do assunto no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul.