REGIÃO – A tragédia da Boate Kiss, em Santa Maria, na região central do estado, completou 10 anos há exatamente uma semana. Uma série de homenagens foram feitas e a cidade reviveu aquela fatídica noite de 27 de janeiro de 2013, que vitimou 242 pessoas, na grande maioria jovens e universitários.
O incêndio na boate, que estava com muitas irregularidades e com superlotação naquela noite, chocou o Brasil e o mundo. Santa Maria é uma cidade que recebe muitos universitários, é sede da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), inclusive, a festa na noite do incêndio era para os alunos de Agronomia da instituição.
Hoje morando em Santa Maria em função dos estudos, o jovem, Willian Corrêa Verdun passou toda a sua infância e adolescência em Gramado junto com a família. Ele conta que enquanto morava na Serra Gaúcha não tinha o entendimento da dimensão do fato.
“Foi uma tragédia que, antes de eu vir mora aqui, nem fazia ideia do tamanho, mas agora sinto e é muito complicado, não imaginava que era tão pesado. As homenagens aqui foram fortíssimas, a comunidade sente muito ainda, o clima na cidade estava estranho na quinta e na sexta-feira (que foi quando a tragédia completou 10 anos), algo inexplicável”, disse.
Willian tem 19 anos e é estudante de fisioterapia na UFSM, sua rotina é, certamente, muito parecida com a de muitas vítimas do incêndio: Pegar o ônibus cedinho, estudar na parte da manhã e da tarde, tendo a noite para descanso e lazer. Pelo menos 101 mortos na tragédia estudavam na Universidade Federal da cidade.
Por telefone, o jovem contou a nossa reportagem que um dos momentos mais difíceis para ele foi quando passou em frente ao prédio da boate. “Uma coisa que chocou muito foi passar na frente da Kiss. Logo que vim não sabia exatamente onde ficava, acabei passando sem querer e foi muito triste. Um sentimento estranho. Uma loucura”, afirmou.
Um dos momentos mais emocionantes da conversa foi quando ele relatou uma situação vivida nos primeiros dias de aula do semestre. “Estávamos tendo aula de bioquímica e a professora explicava sobre o Cianeto (gás tóxico que inalado pelas vítimas no incêndio). Ela começou a chorar no meio da explicação e nos lembrou que havia sido esse gás que vitimou os jovens, e muitos deles eram alunos dela na época. Foi um momento que marcou, muito triste”, disse o garoto, com a voz embargada.

REFLEXOS DA TRAGÉDIA
Meses após o incêndio na Boate Kiss, entrou em vigor, no Estado do Rio Grande do Sul, um novo regramento em Segurança contra Incêndios. A nova legislação aumentou a rigidez quanto ao licenciamento de edificações, o número de medidas de segurança e obrigatoriedades específicas para locais de reunião de público.
Questionado, o Comandante da 2ª Companhia de Bombeiro Militar, que engloba os Pelotões de Bombeiro Militar de Gramado, Canela e São Marcos, Capitão Patrick Dipp da Silva, esclareceu alguns pontos sobre a prevenção de incêndios. Para que as casas noturnas, boates, danceterias, casas de shows e similares possam funcionar, é preciso que o proprietário do local contrate um engenheiro ou arquiteto para analisar a viabilidade da atividade na edificação. Havendo viabilidade, o responsável técnico deve confeccionar o Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndio (PPCI) e protocolará junto ao Corpo de Bombeiros Militar responsável pelo município de instalação da atividade. Depois disso, são analisadas todas as características da edificação e medidas de segurança cabíveis, por exemplo: extintores de incêndio, sinalização e iluminação de emergência, saídas de emergência, alarme e detecção de incêndios, sistema hidráulico sob comando (hidrantes), controle de materiais de acabamento e revestimento, etc.
O Capitão ainda lembra que o responsável pelo local DEVE adotar medidas preventivas a fim de garantir a salubridade do local como controle de público conforme população máxima permitida no local, verificação periódica das medidas de segurança contra incêndio, evitar utilização de artefatos que produzam calor dentro da edificação, etc.
Casas noturnas em Gramado e Canela
O Capitão Patrick afirmou que as casas noturnas, bares e similares de Gramado e Canela são fiscalizadas de maneira organizada e rotineira. As Operações visam orientar os proprietários pelo uso e ocupantes das edificações no tocante à segurança contra incêndio nos locais. “O processo de fiscalização se assemelha ao de outros órgãos públicos, onde há infrações, possibilidade de defesa administrativa e aplicação de sanções. As sanções variam de uma advertência, para infrações de natureza leve, onde não há exposição de risco à vida aos ocupantes, até multas, para infrações de natureza grave, onde há exposição de risco à vida aos usuários dos locais. A qualquer momento, o Corpo de Bombeiros, através do exercício do poder de polícia, poderá realizar interdição de edificações e/ou áreas de riscos em decorrência de situação que configure iminente risco à vida ou à integridade física de pessoas ou ao funcionamento da edificação, elevado risco de incêndio e explosão e elevado risco de colapso estrutural”, salientou.
“Não há como afirmar que todos os locais de reunião de público estejam com Alvará de Prevenção e Proteção contra Incêndios em validade, até porque são inúmeras edificações que comportam este tipo de atividade e nem todos os proprietários pelo uso encaminham o PPCI para análise do Corpo de Bombeiros Militar. O que podemos asseverar é que o Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio Grande do Sul evoluiu e segue evoluindo no quesito: Segurança contra Incêndios”, finalizou o Comandante da 2ª Companhia de Bombeiro Militar, Capitão Patrick Dipp da Silva.
DENÚNCIAS
A população pode realizar denúncias através do e-mail [email protected], sendo que a Corporação responsável pelo município onde se encontrar a edificação irá realizar fiscalização e desdobramentos decorrentes a fim de garantir o cumprimento da legislação de Segurança contra Incêndios e, consequentemente, segurança à integridade física dos ocupantes de locais de reunião de público.
Texto: Gabriel Bremstrop