MARTINA BELOTTO
GRAMADO – Até julho do ano passado, as perspectivas do Hospital Arcanjo São Miguel eram negativas. A entidade operava com déficit mensal de mais de R$ 300 mil. Solicitações de empréstimos ao Executivo eram cada vez mais frequentes na tentativa de quitar os salários atrasados e dívidas com fornecedores. Em 2017, os médicos chegaram a paralisar os atendimentos como forma de protesto pelos atrasos nos pagamentos de seus honorários. A situação vinha sendo remediada com sucessivos empréstimos da Prefeitura à instituição, paliativo que resolvia apenas momentaneamente o problema. Há oito meses, no entanto, a situação mudou de rumo quando Paulo Rogério Sá de Oliveira e Marcio Slaviero assumiram a administração como interventor municipal e superintendente administrativo, respectivamente. Na quarta-feira pela manhã os dois concederam entrevista à rádio Integração Digital, das 8h30min às 10h.
Segundo eles, atualmente, a Casa de Saúde reverteu o panorama do déficit e atingiu um superávit de mais de R$ 100 mil por mês. Para que o equilíbrio financeiro fosse encontrado, os administradores apostaram na contenção de despesas. “Fizemos uma série de ajustes para equilibrar as contas. Unimos alguns setores, por exemplo, além de algumas demissões necessárias que precisaram ser feitas”, explica Marcio.
Ao assumirem a gestão do São Miguel, Paulo e Marcio encontraram grandes desafios na área financeira. “Tinha quase cinco meses de atrasos médicos, era uma situação bem complicada”, relata Paulo, que também é contador e servidor público concursado e atualmente é secretário da Fazenda de Gramado. “Optou-se no passado que o recurso financeiro de custeio fosse investido em algumas obras, e isso acabou fazendo com que não tivesse recurso para as despesas do dia a dia”, comenta Marcio, que também é fisioterapeuta, com especialização em Gestão e Serviços Públicos em Saúde e Administração Hospitalar.
Mesmo com a contenção de gastos, aperfeiçoamentos em algumas áreas foram realizados, como compra de equipamentos que eram necessários. “A gente conseguiu em seis meses terminar com o déficit do Hospital e fizemos diversos investimentos nesse período, incluindo em equipamentos”, aponta Paulo. “Nosso desafio era corrigir questões financeiras, sem interferir naquele que é o objetivo do Hospital, que é atender as pessoas. E a gente não percebeu nenhuma diminuição na qualidade, muito pelo contrário, percebemos uma melhora significativa em diversos serviços assistenciais”, coloca Marcio.
Atualmente, o Hospital conta com 196 funcionários e 103 leitos (sendo 10 de UTI). No último ano, a entidade contabilizou 54,5 mil atendimentos de urgência e emergência, 460 internações na UTI, 4.677 internações em leitos gerais, 746 nascimentos, 4.078 cirurgias e mais de 100 mil consultas em especialidades médicas. Gramado também conta com cerca de 55 mil cartões SUS na cidade.
“Eu sei que a gente não tem que comparar com locais que estão piores, mas é importante sabermos que aquilo que é oferecido aqui no Hospital é incomparável com outros municípios, pode até haver problemas e sempre terá coisas para corrigir, mas é muito acima de outros lugares”, destaca Marcio, que já foi diretor das 19 coordenadorias de Saúde do Estado e secretário da Saúde no município de Dois Irmãos (RS).
Turno estendido em postos de saúde – Segundo ele dos atendimentos de emergência do Hospital, quase 80% são casos que poderiam ser atendidos nas unidades básicas de saúde. Para isso, os postos de saúde do Centro e da Várzea Grande ampliaram seus horários de atendimento com clínico geral até às 21h.
Receitas e pagamentos
Apesar de atrasos nos repasses estaduais, há um grande esforço do Município para injetar valores na entidade. As receitas do Hospital hoje flutuam em torno de R$ 2,5 milhões, sendo que R$ 1,5 milhão é proveniente do Sistema Único de Saúde (SUS). “Gramado coloca praticamente R$ 1 milhão por mês no Hospital, enquanto o Estado coloca R$ 87 mil e ainda atrasa”, ressalta Paulo Rogério.
Dos recursos vindos da União, R$ 127 mil ficam retidos pelo Fundo Nacional de Saúde devido a um empréstimo antigo de 60 parcelas, que se encerra em maio. Quando encerrar essa retenção, inicia a quitação do empréstimo com a Prefeitura, que são 23 parcelas de R$ 240 mil por mês. “Temos um planejamento para quitar essas parcelas, mantendo equilíbrio nas contas”, explica o interventor.
Com relação ao saldo de R$ 100 mil mensais atingido, Marcio afirma que “a expressão superávit não existe no meio filantrópico, porque todo dinheiro que sobra é reinvestido no atendimento. O que não podemos é ser deficitários e precisar ficar pedindo toda hora ou não ter dinheiro para cobrir nossas atividades”. Paulo também frisa que esse é o início de “uma caminhada para um equilíbrio financeiro”.
Venda do Hospital
Com relação às discussões sobre a venda do São Miguel, os gestores destacam uma preocupação de interesse público acima das negociações. “Sabemos que isso vai ter que acontecer em algum momento. Mas há uma preocupação muito grande sobre para quem será vendido, de uma preocupação desses interessados com o futuro da cidade”, salienta Paulo.
Atualmente, há tratativas de compra com a Rede de Saúde Divina Providência e com um instituto de São Paulo. Além disso, a Associação Beneficente São Miguel (ABSM), que administra o Hospital Beneficência Portuguesa de Porto Alegre, também está em tratativas, sendo a negociação mais adiantada entre as três, conforme informaram.
Apoio da comunidade
Após três anos e meio de intervenção, desenvolveu-se um entendimento de que o São Miguel é uma entidade da comunidade. Paulo Rogério e Marcio destacam essa cooperação. “É um entendimento da comunidade de que o Hospital é da população, ele é suprapartidário”, afirma Marcio. “Temos um apoio muito grande da comunidade, do corpo clínico, da administração municipal”, acrescenta Paulo.
Eles acreditam que, a partir de agora, o apoio da população será fundamental para aumentar as receitas. “Chegamos no limite do que a gente poderia fazer em controle e diminuição de despesas, agora precisamos buscar novas receitas e isso passa também pela nossa comunidade e pelos nossos empresários”, pontua Paulo. “Com essa notícia de que sobrou um pouco mais dinheiro, a gente chegou em um equilíbrio, mas continuamos precisando do apoio da comunidade para que a gente possa avançar cada vez mais”, finaliza Marcio.
Ouça a entrevista completa no aplicativo Integração Digital ícone Programas Gravados, quarta-feira, 10 de abril de 2018.