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Cesarianas representam média de 78,52% dos partos na região

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CANELA/GRAMADO – O Brasil ocupa o segundo lugar no mundo em número de cesarianas. Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece em até 15% a proporção recomendada para cesáreas, esse percentual chegou a 78,52% aqui na região em 2018. Para acentuar a situação, muitas dessas cesarianas são feitas de forma eletiva, sem fatores de risco que a justifiquem, e antes de a mulher entrar em trabalho de parto. Hoje, a cesariana tornou-se um hábito, substituindo a naturalidade do nascimento por intervenções cirúrgicas mais rápidas e cômodas, mas nem sempre mais seguras e saudáveis para a mãe e para o bebê.

A cesariana é um procedimento cirúrgico que, quando realizado por razões médicas, pode salvar a vida da mulher e de seu filho. No entanto, muitas delas são realizadas desnecessariamente. Em muitos hospitais, faltam condições de assistência que favoreçam o sucesso do parto vaginal, o que acaba induzindo a mulher a optar pelas cesarianas. “Se tu não deixa uma mulher se alimentar ou beber água durante o trabalho de parto, por exemplo, ela vai ficar fraca no final. Se tu não deixa a mulher tomar um banho quente ou se tu não deixa ela se movimentar, a dor piora. São diversas boas práticas para que esse parto não seja sofrido. A ideia é que o parto seja um momento bonito, não pode ser associado a uma coisa ruim”, aponta a enfermeira obstétrica Vanessa Candido.

Com as pressões externas, a dor do parto pode se intensificar e, nessas horas, a cesárea surge como uma opção salvadora. “Tem um momento em que a mulher chega no ápice da dor. Por mais empoderada que ela esteja, se tu oferecer uma cesárea, ela vai acabar aceitando porque ela só quer parar com a dor. Então, o que precisa ser feito é incentivar a mulher e não ficar esperando que ela peça uma cesárea”, afirma Vanessa.

Em Gramado, o índice de cesarianas ficou em 81,38% entre os partos em 2017, 79,46% em 2018 e 89,66% nos primeiros meses de 2019. Já em Canela, a porcentagem ficou em 80,99% em 2017, 77,59% em 2018 e 82,09% neste ano. Enquanto isso, a meta estadual de partos normais era de 42% em 2017, de 43% no ano passado e de 45% para este ano. Para tentar alterar esses índices, algumas recomendações da OMS foram atualizadas em 2018.

O Unicef, inclusive, afirma que os direitos da criança começam antes mesmo do nascimento, sendo fundamental que as mulheres tenham acesso a um pré-natal de qualidade e recebam todas as orientações para que seus filhos possam nascer no momento certo e de forma humanizada. Conforme Vanessa, Gramado já iniciou um trabalho de plano de parto, que visa orientar a mulher sobre os direitos que ela tem na hora do nascimento. “É um documento feito durante a atenção básica em que ela coloca como ela deseja que seja o parto. É uma forma de esclarecer o que é melhor e mais saudável para a mulher e para o bebê”, comenta.

Esse trabalho de orientação também tem como foco a desmistificação de algumas ideias. Com as intervenções cirurgias realizadas durante os partos normais, alguns medos foram sendo criados. Por outro lado, as cesarianas passaram a ser vistas de maneira vantajosa. “Chegamos em um ponto em que te chamam de corajosa porque tu vai ter um parto normal. Não se fala do lado ruim da cesárea e não se fala do lado positivo do parto natural. A gente precisa trabalhar para que a mulher opte entre parto normal ou cesárea porque ela deseja e não por uma imposição cultural”, salienta Vanessa.

Para entender esse comportamento cultural, Vanessa realizou uma pesquisa para um trabalho da pós-graduação. Ela entrevistou 21 mulheres após o parto com o objetivo de entender o porquê as mulheres optaram pelas cesáreas. Das entrevistadas, 81% iniciaram o pré-natal querendo o parto normal, mas 76% acabaram fazendo cesariana. Vanessa também questionou os motivos para que as mulheres tenham acabado mudando para as cesarianas. De acordo com ela, as razões apresentadas não exigem que realmente fossem feitas cirurgias. “Relacionando os motivos ditos por elas com embasamentos teóricos, pude ver que nenhuma realmente justificava a cirurgia”, explica.

 

Cesáreas influenciam nascimento prematuros

Um dos grandes pontos para reverter os altos índices de cesarianas é estimular as vantagens do parto natural e orientar as mulheres sobre o risco de fazer uma cesariana. A prematuridade, por exemplo, tem aumentado cada vez mais devido às cesáreas. “A única coisa que garante que o bebê está pronto para nascer é quando a mulher entra em trabalho de parto. Se tu marcar uma cirurgia pra tirar ele antes, não vai ser natural. Mesmo que tu tenha indicação para fazer cesárea em um caso de risco, o ideal é esperar entrar em trabalho de parto antes”, relata a diretora da atenção básica de Gramado, Fernanda Meireles.

Outro fator positivo do parto natural é a recuperação da mulher. A cesariana implica em uma série de pontos devido ao corte na barriga. “Quando tu começa a entrar na fase de ter que cuidar do bebê, tu está 100%, porque no parto normal a dor vem antes. Na cesárea tu não consegue cuidar tão bem da criança porque tu fica com dor da cirurgia. O período de pós-parto já traz muitas alterações hormonais pra mulher e, sentindo dor, pode piorar”, ressalta Vanessa.

Ela também acredita que o parto normal traz uma grande diferença no estabelecimento de vínculo entre a mãe e o bebê. “É muito mais difícil de tu receber o teu filho direto na hora que ele nasce quando é uma cirurgia. No parto natural é muito especial essa relação que se cria na hora que o bebê nasce. Esse vínculo da mãe pegar o bebê, amamentar ele, ter esse contato pele a pele fica muito fortalecido”, destaca.

 

Parto humanizado pode ser alternativa para reduzir cesarianas

O parto humanizado caracteriza-se por um conjunto de práticas que buscam readequar o processo de parto dentro de uma perspectiva menos hospitalar, acolhendo a mulher e o bebê de uma forma mais respeitosa. A humanização do nascimento é uma das grandes bandeiras do grupo Nascer Sorrindo Região das Hortênsias, que reúne mães e mulheres interessadas em debater temas da maternidade.

Com reuniões em Gramado e Canela, o grupo aborda questões ligadas ao parto, aos mitos, às fases do trabalho de parto, à amamentação e ao puerpério, visando a troca de experiências e o esclarecimento das participantes. Dentro dos debates levantados pelo grupo está a cultura das cesáreas. “É uma cultura que se instalou a partir de uma imagem de que o parto normal é ruim. É tão comum as cesarianas que hoje elas são o parto normal”, comenta Hanna TreinDrecksler, de 58 anos, que é doula desde 2003 (assistente de parto que acompanha a gestante durante o período da gestação até os primeiros meses após o parto).

Conforme ela, a popularização das cesáreas aconteceu devido aos procedimentos cirúrgicos inseridos durante o parto normal, como a episiotomia (corte vaginal). Algumas dessas práticas começaram a ser feitas sem a autorização prévia da mulher e acabaram tornando a experiência do parto um momento ruim. “As imposições dessas práticas ou exigências da posição em que a mulher deve parir foram traumatizando as mulheres e deixando elas com medo do parto normal”, conta.

Diante disso, a cesárea veio como uma possibilidade que, teoricamente, seria mais simples e tranquila. “A maioria das mães que escolhem cesáreas justificam a escolha porque não querem sentir dor, mas a cesárea tem seus riscos e ninguém te apresenta isso. A mulher tem o direito de escolher a cesárea, mas ela precisa fazer isso de forma consciente e não de maneira induzida. Ainda há uma falsa segurança criada pelo espaço cirúrgico e uma ideia de que o médico é a voz absoluta. Temos que mudar o paradigma, lutar pelo empoderamento da mulher gestante”, aponta Cássia Barbosa, de 33 anos, que é mãe de uma menina de três anos e está grávida de outro bebê.

Para ela o grande desafio é fazer com que o parto natural volte a ser visto como normal. “Às vezes tu chega no consultório e fala que quer um parto natural, e os médicos já tratam a tua escolha com a frase: se der certo, se a gestação for tranquila, se tu conseguir. Sempre tem aquela condicional”, comenta.

Uma das grandes lutas defendidas pelo grupo é esclarecer as mulheres sobre a possibilidade dos partos domiciliares. De acordo com Hanna, nos partos domiciliares sempre há acompanhamento de enfermeiras obstétricas, que são preparadas para atender partos sem riscos. “Os partos em casa não são feitos de qualquer jeito. Há sempre um plano b, há acompanhamento. O pré-natal também não é deixado de lado”, explica.

Priscila Fioreze de Liz, de 34 anos, que é mãe de três filhos, viveu a experiência de ter um parto domiciliar. Para ela, a grande vantagem é a segurança trazida pelo ambiente aconchegante e a tranquilidade de não se sentir pressionada. “Tu está em um ambiente que conhece, rodeada das pessoas que escolheu para estarem ali, o que gera mais segurança. Tu não se sente pressionada, tu sabe que vai acontecer dentro do teu tempo”, afirma.

Cássia acredita que essa tranquilidade de não se sentir pressionada com relação ao tempo do nascimento também precisa ser respeitada nos hospitais. “As interferências externas minam muito a confiança da mulher. Com um parto mais humanizado, com profissionais que respeitam teu tempo, tu acaba tendo a segurança de que tu vai chegar onde planejou, isso tanto em casa quanto em um hospital”, enfatiza. “Precisamos entender que o parto não é uma questão só física, é psicoemocional”, acrescenta Hanna. 

 

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