
Vamos começar por uma pauta que, sinceramente, já cansou de dar voltas e continuar no mesmo lugar: a situação dos indígenas em Canela. Falei por cima disso na sexta-feira, e volto agora porque o prefeito Gilberto Cezar também abordou o tema — de maneira, digamos, bastante superficial.
Durante o governo passado, havia uma expectativa — ou seria ilusão? — de que bastava “tirar os indígenas da frente da Catedral”, “É só chegar e tirar” que tudo estaria resolvido. Essa era a fala constante, tanto da oposição, atual situação, quanto de uma parcela expressiva dos comerciantes da região central. Um raciocínio simplista, quase mágico: se não estão mais ali, o problema some.
Eis que vem o novo governo. A gestão atual, que vislumbrava uma resposta mais ágil e resolutiva, também percebeu que não se trata de “chegar e tirar”. O próprio Gilberto Cezar apontou que não é possível resolver esse impasse na força — e isso já é um avanço, por mais básico que pareça. Não estou aqui defendendo ninguém, aliás, também imaginei que esse capítulo teria sido encerrado rapidamente. Cem dias de governo e, nesse ponto, estamos zerados.
A intenção da administração, que chegou até esta coluna, é transferir os indígenas para a Praça João Corrêa. Nada de novo no front. Esse mesmo plano já existia durante o governo Constantino — que, por sua vez, tampouco resolveu coisa alguma. Na época, houve uma tentativa de costurar um acordo para realocar os indígenas para a Praça, com direito a projeto para regularizar a venda de produtos. A proposta era que 70% do que fosse vendido tivesse origem indígena e 30% fosse industrializado, desde que com nota fiscal. Uma tentativa de ordenar, regularizar, dar cara de “feira cultural” ao que hoje é visto como “problema urbano”. Mas o projeto morreu na praia (ou na Felisberto Soares, que é o caminho da Praça até a Igreja). Os indígenas não aceitaram as condições.
A ideia era construir 16 casinhas. Uma estrutura fixa na Praça João Corrêa, pensada para oferecer dignidade, organização e espaço para os indígenas trabalharem. O projeto só avançaria se todos os envolvidos concordassem. Pois bem: só os indígenas residentes em Canela toparam. Os outros — a maioria dos que estão hoje nos arredores da Catedral de Pedra — não são da cidade. A solução escorreu pelo vão dos dedos.
Agora, como uma reprise, surge a promessa de que os indígenas serão contemplados na reformulação da Praça João Corrêa. O projeto de revitalização está no radar e prevê espaço para os povos originários. A ideia parece boa, mas continua dependente de uma palavra mágica: aceitação. Se eles toparem, ótimo. Se não, o discurso volta a ser aquele velho conhecido: “a lei será aplicada”. Só que essa mesma lei, até hoje, não deu conta de garantir os direitos dos indígenas nem de manter a cidade em ordem. A quem ela serve, então?
Enquanto escrevo esta coluna, está rolando uma reunião entre Prefeitura, caciques e a Funai para tentar costurar um novo acordo. Pode sair algo concreto daí. Amanhã eu trago a atualização e, tomara, que com uma boa novidade.
Na mesma
Saindo do centro turístico e indo para a realidade do canelense: há mais de um mês estive na casa da família Tomasi, na rua Nossa Senhora Medianeira, bairro Vila Maggi. Se você acha que o problema dos indígenas é complicado, é porque ainda não sentiu o cheiro — literal — da situação da Elisete Tomasi e seus familiares. Vamos recapitular.
A rede de drenagem ali está comprometida. O esgoto de outros imóveis está sendo despejado no terreno da família. A água podre escorre pelo pátio, trazendo risco de doenças, mau cheiro e até risco estrutural. A diarista Elisete, com medo real, me contou que teme sair para trabalhar e voltar pra ver a casa desabando. Não é exagero. As fundações estão comprometidas pela infiltração constante. A vida virou um jogo de medo, lama e desespero.
E o que foi feito? Nada de prático. A família buscou ajuda da Aegea/Corsan, procurou a Prefeitura, ligou, implorou, esperou. A Corsan, ao menos, foi até o local. Constatou onde está o problema. E notificou a Prefeitura. Uau. Que eficiência.
A situação permanece a mesma.