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A renúncia anunciada

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Coluna publicada no dia 28/05.

Não foi surpresa pra ninguém. Quem acompanha os bastidores da política local já sabia: Joãozinho Silveira ia cair. Só não sabíamos como. Agora sabemos. Ontem, terça-feira (27), o vereador protocolou sua carta de renúncia e abandonou o cargo antes que a Câmara votasse sua cassação, prevista para a próxima quarta-feira. A jogada foi clara: preferiu pular fora antes de ser expulso. Uma manobra política que, apesar de evitar o vexame da cassação em plenário, não apaga a crise — nem os efeitos dela.

Todo mundo com quem conversei apontava a mesma coisa: a cassação seria por unanimidade. O clima entre os vereadores era de indignação e vergonha. Ninguém queria passar pano. Joãozinho, percebendo isso, decidiu sair pela porta dos fundos. Mas é bom lembrar: sair antes da votação não significa escapar da punição.

O que diz a Lei da Ficha Limpa

A legislação brasileira é bem clara nesse ponto. Quando um político renuncia depois que o processo de cassação já foi aberto, ele entra automaticamente no radar da inelegibilidade. Ou seja: mesmo que não tenha sido cassado formalmente, se a Justiça Eleitoral entender que ele largou o cargo para escapar da responsabilização, ele pode ficar oito anos fora das urnas, somados ao tempo restante do mandato que abandonou.

E esse é exatamente o caso de Joãozinho. O processo já estava em andamento, com parecer final da Comissão Processante apontando quebra de decoro parlamentar. Ou seja: se depender da letra da lei, a inelegibilidade dele é quase um caminho natural. Agora a bola está com a Justiça Eleitoral, que vai analisar a renúncia e decidir se aplica ou não a punição.

O trabalho da comissão e a fala do relator

No meio disso tudo, vale destacar o trabalho da Comissão Processante, composta por Lucas Dias (PSDB), Rodrigo Rodrigues (PDT) e Nene Abreu (MDB). Eles passaram semanas analisando provas, depoimentos e denúncias. O relator, Rodrigo Rodrigues (PDT), fez uma fala firme na sessão de ontem:

“Como bem falou o presidente, hoje o vereador renunciou o seu mandato e já não é mais vereador dessa Casa. Nós tínhamos marcado para a próxima quarta-feira a sessão de cassação, e eu acredito que o vereador Joãozinho já imaginava o resultado da sessão de quarta-feira e optou, enfim, pela renúncia.”

Em sua fala, Rodrigo também pediu que a população reavalie sua visão sobre o Legislativo:

“A decisão é toda dele, ela deve ser respeitada e nem cabe julgamento de vereador nenhum. Mas como membro da Comissão e relator dela, eu não posso deixar de falar isso aqui, que a todos aqueles que veem essa Casa com o descrédito, que não confiam nos vereadores e têm até repulsas por decisões que foram tomadas no passado, eu até peço uma reflexão.”

Ele destacou o parecer da comissão:

“Nós entregamos nosso parecer final com a decisão de que, sim, havia elementos que justificavam a sessão de cassação e que, sim, entendemos que há quebra de decoro por conduta vexatória.”

E ainda reforçou que não houve conchavo:

“Esse parecer é público, qualquer um pode ter acesso. Nós somos vereadores novos. Muitos de nós estamos aqui pela primeira vez, eu me incluo num desses, quando uma parte da opinião pública diz que tudo isso ia virar pizza, que tem conchavo político e que todos são iguais, não é verdade.”

“Isso não ia virar pizza, não teve conchavo nenhum e nós não somos iguais. Eu de verdade peço um crédito para a Câmara de Vereadores, aos vereadores, e um voto de confiança, por mais que eu saiba que isso é difícil, depois de tudo que aconteceu nos últimos anos. Mas, de coração, eu vejo pessoas querendo trabalhar e dar o seu melhor.”

A importância simbólica do caso

Mesmo com a renúncia, o episódio não deve ser tratado como página virada. Pelo contrário. Ele deixa uma ferida — e uma lição. A Câmara, tão criticada nos últimos anos por omissão ou proteção corporativista, dessa vez deu sinais de mudança. Não blindou. Não aliviou. Fez o que precisava ser feito.

“Isso tudo foi um episódio triste, deixa cicatrizes, mas deixa aprendizados também. Ao vereador Lucas e ao vereador Nene, foram dias difíceis, de muito estudo, e acredito que nós fizemos um trabalho à altura do que a situação exigia. Por isso eu peço, deem uma chance para essa nova Câmara, eu tenho certeza que não são todos que querem trair a confiança das pessoas”, concluiu Rodrigues.

Justiça Eleitoral

Vamos deixar claro: a renúncia de Joãozinho não encerra o problema, ela apenas muda o rumo. Ele não é mais vereador, mas a sua conduta permanece sob análise da Justiça Eleitoral. Se a decisão for pela inelegibilidade, ele fica fora do jogo político por um longo período. É uma punição dura, mas proporcional a quem trai a confiança de quem o elegeu.

E a Câmara, que já foi alvo de tantas críticas, agora vive um momento decisivo: provar que pode sim agir com seriedade e coragem, mesmo diante de crises internas. Foi o que tentaram demonstrar os vereadores da Comissão.

Relembre o caso

A denúncia por quebra de decoro parlamentar contra Joãozinho Silveira teve origem direta em sua prisão, ocorrida no fim de março. O episódio escancarou o suposto envolvimento do então vereador num esquema de desvio de materiais públicos destinados a famílias em situação de vulnerabilidade. A prisão preventiva foi decretada durante as investigações da Polícia Civil, e a repercussão imediata na cidade gerou indignação, dentro e fora da Câmara.

Com base nesse episódio uma denúncia por quebra de decoro foi protocolada na Câmara, a Comissão Processante foi instaurada e, após semanas de apurações, concluiu que houve sim quebra de decoro — motivando o parecer final pela cassação, que seria apresentado em breve. A Polícia Civil indiciou Silveira por receptação qualificada, falsidade ideológica e peculato. O Ministério Público, no entanto, apresentou denúncia por dois deles: peculato e falsidade ideológica.

As investigações apontam que, em 2024, enquanto era Secretário-Adjunto da Assistência Social e Coordenador da Defesa Civil, ele teria desviado um kit de casa (avaliado em R$ 23 mil) e um kit de banheiro (R$ 6 mil), que seriam entregues a uma família do interior. Os materiais foram encontrados numa propriedade rural na localidade de Canastra Alta.

A família que deveria receber os itens foi induzida a assinar documentos como se tivesse sido beneficiada — o que não ocorreu. Isso configura falsidade ideológica, já que dados falsos foram inseridos em documentos públicos. Agora, mesmo fora do cargo, Joãozinho segue como réu na esfera criminal.

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